Ainda não é possível medir os impactos sobre a indústria brasileira gerados pela decisão do governo dos Estados Unidos de impor uma taxa de 25% sobre o aço e o alumínio importados. Executivos dos dois setores admitem que o clima é de incerteza e apreensão e informam que buscam, por intermédio do governo brasileiro, conseguir uma flexibilização da medida.
“Inicialmente, as novas taxas atingem igualmente todos os países e não mudam o quadro geral de competitividade. Mas essa situação não deve durar”, diz Marco Polo de Mello Lopes, presidente executivo da Aço Brasil, instituição que representa as siderúrgicas nacionais. “Vários países negociam novas taxas em Washington. Aqueles que fizerem acordos mais rápido vão levar vantagem. Se formos lentos, vamos perder espaço.”
Reino Unido e EUA já anunciaram acordo para a redução de tarifas sobre o aço, mas os detalhes ainda não são públicos.
Os Estados Unidos são o principal destino internacional do aço brasileiro e o segundo do alumínio. Em 2024 o Brasil exportou 4,08 milhões de toneladas de aço para lá, o que representou 42,6% do volume exportado pelo país, e obteve na operação US$ 2,99 bilhões, 39,2% da receita das exportações siderúrgicas. O Brasil foi o segundo maior exportador para os EUA, atrás apenas do Canadá.
O principal item exportado para foi o aço semiacabado, que gerou uma receita de US$ 2,3 bilhões. É um item que não é vendido diretamente ao consumidor; é usado como insumo na indústria do aço, que faz a laminação e revende. “Ao taxar o semiacabado, os Estados Unidos tiram competitividade da própria siderurgia americana”, diz Lopes.
Os EUA não são autossuficientes em aço semiacabado e demandam uma importação anual de 5,6 milhões de toneladas. Construir usinas para atender essa demanda é um processo lento, que leva entre três e quatro anos.
Na balança comercial do aço, o Brasil importa carvão metalúrgico dos Estados Unidos (US$ 1,4 bilhão em 2014), e US$ 3,9 bilhões em máquinas e equipamentos, que contêm muito aço embarcado. “Se levarmos em consideração toda a cadeia produtiva, os Estados Unidos são superavitários em relação ao Brasil”, destaca o executivo da Aço Brasil.
Em 2018 – quando o primeiro governo Trump criou uma taxa de 25% sobre aço e alumínio importados -, esses argumentos foram suficientes para levar o governo americano a adotar uma política de cotas para as compras de aço brasileiro. Naquele ano foi negociada uma cota rígida (“hard quota”), que não poderia ser ultrapassada, nem pagando tarifa extra de importação. Por outro lado, todo o aço exportado para os EUA, até o limite anual de 3,5 milhões de toneladas de semiacabado e 687 mil toneladas de laminados, tinha tarifa zerada. A solução valeu até março deste ano.
“O pleito da indústria siderúrgica brasileira é a volta desta política de hard quota”, diz Lopes. As negociações tiveram início em março com uma videoconferência do vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, o secretário de Comércio dos Estados Unidos, Howard Lutnick, e o representante comercial dos EUA, Jamieson Greer.
Tatiana Prazeres, secretária de Comércio Exterior do ministério, considera que o primeiro momento é de esclarecer os aspectos da política tarifária brasileira aos americanos e apresentar argumentos, em um processo de negociação que se apresenta como difícil e lento. “Mostramos que o Brasil não é problema para os EUA. Eles têm superávit comercial conosco”, afirma. “Em oito dos dez principais itens que importamos dos EUA, a tarifa de importação é zero”, diz.
Em relação às novas tarifas sobre aço e alumínio, a estratégia é mostrar a importância do fornecimento brasileiro para a cadeia produtiva americana, como apresentado por Lopes. “Estamos trabalhando em sintonia com a iniciativa privada, queremos uma relação de ganha-ganha com os EUA”, diz Prazeres.
A indústria brasileira do alumínio também pleiteia a substituição da tarifa de 25% por um sistema de cotas que permita volumes anuais isentos de sobretaxa. “É nossa principal proposta”, afirma Janaina Donas, presidente executiva da Associação Brasileira do Alumínio (Abal).
Em 2024, os Estados Unidos foram destino de 16,8% das exportações brasileiras de produtos de alumínio, totalizando US$ 267 milhões e 72,4 mil toneladas, mas representou menos de 1% das importações americanas. Os principais itens embarcados foram chapas e folhas de alumínio.
No primeiro trimestre de 2025, as exportações brasileiras para os EUA cresceram 22% em volume em relação ao mesmo período de 2024, para 22,2 mil toneladas. “Esse avanço refletiu um movimento de antecipação de embarques, diante da expectativa da entrada em vigor da nova tarifa”, diz a executiva. Até março, vigorava uma tarifa de 10% sobre as exportações do setor aos EUA.
De acordo com Donas, os americanos não são autossuficientes na produção de alumínio primário – resultado da transformação direta da bauxita. Ela calcula que o país precisaria de cinco a oito anos para estabelecer uma produção com escala suficiente para atender sua demanda interna.
A principal preocupação do setor no Brasil é que as novas tarifas americanas gerem desvio de comércio, ou seja, que países redirecionem suas exportações, que anteriormente atendiam aos Estados Unidos, para mercados alternativos e menos protegidos, como o Brasil, e para isso usem práticas anticompetitivas, como o dumping. “O Brasil precisa fortalecer seus instrumentos de defesa comercial”, diz Donas.
Prazeres informa que o governo brasileiro está preocupado com o risco de desvio de comércio e faz um monitoramento “com lupa” de todos os produtos e agirá, caso necessário.
Fonte: Valor Econômico