Aprovação de revisão de gastos alivia pressão sobre moeda brasileira
Política fiscal conteve prêmios de risco durante semana de intervenções do Banco Central
Os preços dos ativos brasileiros na semana passada destacaram a sensibilidade dos agentes financeiros à política fiscal do país. Apesar da intervenção do Banco Central na taxa de câmbio para tentar conter disfunções, o estresse não se dissipou facilmente. A flexibilização do prêmio de risco para o real brasileiro e outros ativos só foi vista após a aprovação parlamentar de uma abordagem mais austera para as finanças públicas com a aprovação de um pacote de revisão de gastos, juntamente com sinais de que o governo está disposto a discutir novas medidas para direcionar a dívida pública para um caminho mais sustentável.
O primeiro sinal veio na terça-feira, quando o presidente da Câmara, Arthur Lira, anunciou que os projetos do pacote fiscal seriam colocados em votação, o que ajudou a acalmar os mercados e afastou os ativos locais dos piores momentos do dia. Naquele momento, mesmo após as intervenções do Banco Central no mercado de câmbio com vendas de dólares no mercado à vista, a taxa de câmbio atingiu o pico de R$ 6,20 por dólar, mas encerrou a sessão com apenas 0,02% de alta, negociada a R$ 6,0956. A volatilidade da moeda também foi agravada pela escassez de dólares no mercado à vista, comum nesta época do ano.
Na quarta-feira, com indícios de que o pacote fiscal seria diluído, os ativos domésticos voltaram a sofrer, e a taxa de câmbio atingiu R$ 6,26 no final da sessão. No dia seguinte, quinta-feira, o Banco Central realizou sua maior intervenção diária no mercado de câmbio à vista, injetando R$ 8 bilhões, com um leilão de venda de US$ 5 bilhões anunciado pela autoridade monetária após a taxa de câmbio disparar para R$ 6,30 no pico do dia. Somente depois disso a dinâmica da moeda viu um alívio significativo, auxiliada pela aprovação dos projetos de lei do pacote fiscal na Câmara.
Na sexta-feira, um vídeo do presidente Lula sugerindo a possibilidade de novas medidas fiscais se necessário foi bem recebido, levando a taxa de câmbio a aprofundar suas perdas e encerrar a sessão em R$ 6,0719, uma queda de 0,81%. Isso ressalta a sensibilidade do mercado de câmbio à trajetória da dívida pública e às discussões fiscais.
“Como ainda estamos diante de um ano fiscal relativamente complicado em 2025 e possivelmente em 2026, isso nos dá a sensação de que ainda podemos ver alta incerteza fiscal e, portanto, continuaremos tentando entender como ela será reduzida por meio de novas ações anunciadas pelo Executivo e aprovadas pelo Congresso”, disse Mauricio Une, chefe de estratégia macro para a América do Sul do Rabobank, cuja previsão aponta para a taxa de câmbio em R$ 5,94 por dólar até o fim do ano que vem.
“Tivemos um vídeo do presidente que sugere que podemos ver o anúncio de novas medidas, mas ainda é muito cedo para entender quais seriam essas medidas e como elas poderiam reduzir a incerteza fiscal e ajudar o arcabouço fiscal entre 2025 e 2026”, disse ele.
Nesse sentido, economistas do Santander liderados por Ana Paula Vescovi, ex-secretária do Tesouro, escreveram que o comportamento recente do real brasileiro “serve como exemplo das limitações das análises cambiais que consideram apenas diferenciais de juros”. Segundo o banco, há dois regimes distintos: “Em momentos de piora da percepção do risco Brasil, a correlação se torna positiva; e a alta dos juros atrai fluxos de moeda e fortalece o real frente ao dólar quando acompanhada de menor incerteza”.
O Santander observa que o “choque” de alta de 300 pontos-base na taxa Selic sinalizada pela autoridade monetária na semana passada foi acompanhado de depreciação do real devido à ausência de sinais de que a postura fiscal mudaria. “Alguns modelos sugerem uma taxa de câmbio excessivamente alta, mas o ciclo vicioso entre políticas econômicas, que pode ser exacerbado no ano que vem, nos leva a revisar as projeções”, dizem os profissionais. O Santander agora espera que a taxa de câmbio atinja R$ 6,10 por dólar até o fim deste ano e R$ 6,00 até o fim de 2025.
FONTE: Valor Econômico
https://valorinternational.globo.com/economy/news/2024/12/23/approval-of-spending-review-eases-pressure-on-brazilian-currency.ghtml?utm_source=newsletter&utm_medium=email&utm_campaign=valorinternational