UE classifica o Brasil como ‘risco padrão’ na lei antidesmatamento
Apesar do alívio com a classificação, o Brasil critica a lei da UE por considerá-la tendenciosa e alerta para impactos duradouros no comércio e na reputação.
A Comissão Europeia divulgou nesta quinta-feira sua primeira lista de classificação que classifica os países pelo risco de desmatamento, como parte de novas regras que visam regulamentar a importação de sete commodities para a UE a partir do final deste ano. A medida terá implicações significativas para o comércio agrícola.
O Brasil foi classificado como país de “risco padrão” — essencialmente uma designação de risco médio — ao lado de outras 49 nações. A classificação foi recebida com alívio, já que muitos observadores previam que o país seria rotulado como “alto risco”. Há tempos, alguns enxergam a regulamentação antidesmatamento da UE e sua lista de produtos como uma forma de atingir implicitamente o Brasil.
Apesar disso, a regulamentação e a classificação de risco manterão o Brasil sob constante vigilância da UE. É amplamente esperado que Bruxelas use a lei para questionar a expansão da produção agrícola em determinadas áreas.
Além disso, o sistema de “benchmarking” adotado pela UE prejudica a imagem internacional do Brasil. A abordagem baseada em risco também criará distorções comerciais, favorecendo efetivamente alguns países — como os Estados Unidos — em detrimento de outros.
O Brasil e outras nações produtoras têm se posicionado consistentemente contra a lei antidesmatamento da UE, argumentando que o bloco não tem o direito de impor unilateralmente tais mecanismos. Também questionam a metodologia usada para atribuir os níveis de risco aos países.
Pedro Miguel da Costa e Silva, embaixador do Brasil junto à UE, afirmou:
“Nunca consideramos a lei antidesmatamento uma ferramenta adequada para lidar com o problema que os europeus alegam querer ajudar a resolver. O sistema de classificação de países é um aspecto particularmente prejudicial e discriminatório da legislação. Basta ver como os países da UE votaram em suas próprias classificações — e, sem surpresa, todos acabaram como ‘baixo risco’.”
Apenas quatro países foram classificados como de alto risco: Rússia, Belarus, Mianmar e Coreia do Norte — todos já sujeitos a sanções comerciais da ONU ou da UE para as commodities em questão.
Outros cinquenta países foram incluídos na categoria de “risco padrão”, incluindo grandes exportadores agrícolas da América Latina, África e Ásia. Entre os países do Mercosul, apenas o Uruguai recebeu o selo de “baixo risco”, o que provavelmente explica por que o país não se juntou aos demais na contestação à regulamentação europeia. Na Ásia, Vietnã e Tailândia também receberam classificações de baixo risco, possivelmente devido à disposição de atender certas exigências da UE.
Ao todo, 142 países foram considerados de “baixo risco” de desmatamento. Esse grupo inclui aliados ocidentais importantes, como Austrália e Canadá; potências globais como Estados Unidos, China e Índia — países com os quais a UE deseja manter boas relações ou evitar antagonizar — e outros com pouca floresta restante para desmatar. A UE afirma que a lista foi aprovada por consenso entre os Estados-membros.
Ainda assim, com 50 países na categoria de risco médio, há certo equilíbrio. O Brasil estaria em situação pior se a lista de risco padrão fosse mais curta.
A classificação de risco é baseada na produção dos sete produtos abrangidos pelo Regulamento da UE sobre Desmatamento (EUDR): gado, cacau, café, óleo de palma, borracha, soja e madeira, além de produtos derivados como couro, chocolate, pneus e móveis. Esses produtos foram selecionados com base em avaliações da UE sobre seu impacto significativo no desmatamento.
A regulamentação visa proibir o acesso ao mercado da UE para essas commodities se forem produzidas em áreas desmatadas após 31 de dezembro de 2020. Exportadores deverão apresentar provas documentais de que sua produção está livre de desmatamento a partir dessa data para poder vender no bloco europeu, que conta com 27 países.
A classificação de risco determina o nível de fiscalização exigido por parte dos países da UE: 9% dos operadores oriundos de países de alto risco, 3% de risco padrão, e 1% de países de baixo risco. Na prática, isso significa que uma porcentagem maior ou menor de contêineres será inspecionada, dependendo da classificação do país exportador.
Os 142 países classificados como “baixo risco” terão acesso a procedimentos de diligência simplificados. Operadores e comerciantes ainda precisarão coletar informações, mas não precisarão avaliar nem mitigar os riscos relacionados ao desmatamento.
A UE sustenta que o sistema de benchmarking por país garante uma implementação simples, justa e econômica da lei antidesmatamento. Bruxelas também afirma que a política já está gerando resultados positivos no combate ao desmatamento, às mudanças climáticas e à perda de biodiversidade. Produtores como o Brasil, no entanto, consideram a legislação falha e discriminatória.
Fonte: Valor International